terça-feira, abril 08, 2008

Somente um pesar...

Eles falam risonhos, parecem se divertir, a gesticulação é enérgica e os movimentos bruscos do corpo expelem viva sinceridade, mas sinto-me apático, a maior parte do tempo é assim, confesso com certo pesar; eu começo prestando atenção no que estão dizendo, até me esforço para achar graça também e raramente consigo. Quando sim, brinco e me envolvo com a mesma patetice. Mas dura pouco. A consciência da minha tolice emerge e me retenho ou então sinto que o meu tom abobado não encontra respaldo. Aí me retenho mais ainda, envergonhado. Um deles me falava qualquer coisa e eu já não sabia mais o que era, ele sorria e eu respondi com lábios fingidos sem saber o porquê da graça. Não faço isso em completo piloto automático, às vezes é semi-consciente, nem é por querer parecer sociável, é por não querer que se sintam sem atenção. É horrível sentir-se desatendido. Eu dou muita atenção, muita mesmo e, às vezes, a dou até sem estar atento. Não acho que isso seja de todo falso, é um caso em que o efeito benéfico desculpa a ausência da intenção. Mas só faço assim com os de pouco ou médio apreço. Os de muito apreço têm sempre a minha atenção real, completa, nem tinha como ser diferente, estou ligado a eles por um vivo interesse, digo, interesse neles. É o que me alimenta de verdade, me tira da apatia, os seres humanos, raríssimos, que se me permitem o mergulho. Não só isso, que também me despertam, por razões que desconheço, a vontade de lhes conhecer a essência. A eles me dôo integralmente. Mas com os outros ali, os de médio, pouco ou nenhum apreço, ah, confesso, às vezes eles me estimulam o vazio total, não um vazio de sentido, angustiante ou entediante, vazio de pensar mesmo. Fico diante deles completamente absorto no nada. Nunca meditei, mas pelo que falam da experiência, é o que penso ter nessas situações, um certo não-pensar. Depois essa tranqüilidade vazia dá lugar ao pesar por não ter participado da interação, por ter vivido toda a situação não como se estivesse nela, de dentro, mas um passo atrás, de fora, só olhando. Pior de tudo é saber que isso é tolo. De fora, percebemos o sentido para terceiros, como fica facilmente visível nos filmes, o sentido da existência de uma pessoa parece saltar às vistas. Só que para o Eu, o sentido está sempre dentro e não há como percebê-lo de fora, o sentido é o tipo de coisa que o Eu só pode viver imerso sem nunca tocar. Eu mesmo cavo a minha tragédia querendo viver com dupla cidadania. Ou lá ou cá, meu caro. E quem disse que me controlo? A todo instante quero capturar o sentido das minhas vivências, por ciúmes de mim, por curiosidade, por não querer perdê-las, por esmerar pela intensidade máxima da vivência, por ser assim doentio na vontade de transcender, e, claro, quando tento fazê-lo, o sentido que havia se subtrai magicamente da vivência, ou, em outras palavras, a vivência se des-vivencia. Aí aparece aquela consciência tão bem conhecida do vazio de sentido, da angústia e do tédio, cada qual com um sabor doloroso diferente. Eu só não me considero um caso perdido porque pelo menos o amor eu vivencio completamente de dentro, não coloco nem um dedinho pra fora, pelo menos nessa dimensão meu instinto se mantém sábio e imune à estultice da razão. É o que me enraiza na vida.

Um comentário:

Patr�cia disse...

Me soou familiar, conheço uma pessoa assim.
Eu sou bem diferente, mergulho no novo, bem mais do que naqueles que já me são objeto de grande apreço.