sexta-feira, fevereiro 01, 2008

Subsolo

Estou lendo Memórias do Subsolo e nem vou dizer que recomendo, pois tudo que vem da Rússia ou dos povos eslavos, exceto o comunismo, e meu exceto aqui é vibrante e enérgico, eu recomendo em princípio. Enfatizo, em princípio. Então que no livro o personagem principal desenvolve uma tese bem interessante. Resumidamente, pois sua exposição é longa e bem mais expressiva e persuasiva do que pretendo fazer aqui, ele sustenta que mesmo se tivéssemos o conhecimento total, de todas as leis, e, desta maneira, soubéssemos calcular todo o futuro e o que fosse melhor e mais vantajoso segundo a razão para nós, ainda assim nem sempre optaríamos pelo "melhor". Na verdade, diz ele, o "melhor", por vezes, e talvez paradoxalmente, não é o melhor, mas aquilo que a vontade opta por capricho e sem qualquer razão aparente. Evidentemente, há aí uma certa tensão, pois se optamos por algo contrário à razão e ao previsto, então nosso saber não era total. Creio que é justamente isso o que ele está nos dizendo, que há algo intrinsecamente arbitrário no humano que impossibilita um saber total a seu respeito. O essencial de cada um de nós é evasivo, por certo, escapa até do próprio sujeito.

O amor é o melhor exemplo dessa agradável e caótica irracionalidade que nos habita essencialmente. Seria muito mais vantajoso deixar de gostar de quem não gosta de nós ou simplesmente gostar apenas de quem gosta da gente, mas quem acompanha de perto essa ladainha da razão? Ninguém. Eu posso gostar de alguém e encontrar inúmeras justificativas para este meu gostar, o que, no entanto, terá apenas o efeito de corroborar ou não a decisão de ir em frente com este gostar, mas não lhe aumentará ou diminuirá em nada. Posso gostar sim sem qualquer razão visível. E mesmo quando toda a razão for contrária, ainda acontecerá de optar pelo mergulho no caos, pelo insucesso provável. O ser humano é assim, previsivelmente imprevisível.

Agir em conformidade com a razão? Que nada, as razões, os motivos geralmente são sentidos como algo que constrange, que vêm de fora, que se impõem, não é algo que você sente como emanando de si, como sendo suas, quando muito, elas têm o efeito póstumo de aplacar a consciência por uma decisão já tomada, mas na hora do vamos ver, do ir em frente, do mover-se, não é ela que você escuta, é o teu próprio caos que te dá as mãos e te leva sabe-se lá para onde.

Um comentário:

Luiselza Pinto disse...
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