domingo, fevereiro 25, 2007

Alianças

Outro dia estava conversando com uma amiga sobre o uso de alianças e ela me disse que gostava delas para simbolizar o compromisso. Um rito que para ela é agradável respeitar. Esse rito em si eu não respeito, mas posso vir a entender e respeitar a vontade da outra pessoa em querer participar desse rito. Meu amor comporta alguma abnegação. Gente, é sério, eu tenho claustrofobia anular. Tenho pânico dessa coisa entrar no dedo e não sair mais. Quando coloco um anel no dedo, e isso aconteceu pouquíssimas vezes, eu fico girando o anel o tempo todo para constatar que ele não grudou. Outra: eu jamais colocaria essa coisa no meu anular para afastar a falta de confiança. O curitiboca é hilário a esse respeito. Se vangloriam de ser o povo mais familiar, mais nuclear, mais fiel e, para prová-lo, usam alianças de quase 1 cm de espessura. Não estou mentido. Cheguei a levantar a hipótese de que os joalheiros aqui fossem ruins, não soubessem fazer alianças finas e discretas. Mas não, é o curitiboca mesmo que sente prazer em arrotar os seus compromissos, expressando com este ato, ao meu ver, a falta brutal de confiança que tem uns nos outros. Aqui não estão simplesmente participando de um rito, estão sim desesperadamente externando seus medos e desconfianças. Burrice, pois a aliança é completamente ineficaz contra a infidelidade. Diria até que a estimula. O proibido seduz. Para falar a verdade, estou me lixando para a fidelidade. Pouco importa se outras mulheres estão colocando a boca no pinto do seu namorado ou se outros homens estão colocando o pinto na boca da sua namorada. Importa mesmo é se você está sendo sincero consigo mesmo e com aquele que diz amar e respeitar. Só isso.

sábado, fevereiro 24, 2007

Obrigação

Agora que eu não tenho mais compromisso algum com a filosofia, eu posso me dedicar a ela de corpo e alma. Por razão similar, muitos amantes conseguem ser companheiros melhores para as esposas que os seus próprios maridos.

domingo, fevereiro 18, 2007

Lágrima

Eu prefiro a estética da lágrima à estética do sorriso. Um rosto com choro é infinitamente mais belo que um rosto com sorriso. Obviamente, refiro-me ao choro de uma lágrima contida que salta dos olhos involuntariamente, uma lágrima irrefreável, exprimindo uma dor que o sujeito não consegue conter. O choro esganiçado de alguém que tenta multiplicar pelo comportamento uma pequena dor é feio e imoral. O primeiro choro não, ele é sublime, é a expressão de um sentimento autêntico, é a verdade em pessoa. Já o sorriso é traiçoeiro, quase sempre falso. Exprime uma mentira que você gostaria de ouvir. Seduz pela leviandade. Sim, há os verdadeiros, mas é difícil apontá-los.

sábado, fevereiro 17, 2007

PdQ

Queen na vitrola e a mão na massa para preparar aquilo que sei fazer de melhor: pão de queijo. Posso vir a esquecer tudo que aprendi em Minas, durante os 15 anos que lá passei. Posso, com o passar dos anos, deixar de lado as suas interjeições simpáticas como "uai!" e "sô!", mitigar as imagens de Belo Horizonte, que, aliás, nem é tão belo assim, mas jamais me esquecerei do seu pão de queijo. Simplesmente inigualável. Quem já comeu um lá ou um feito pelas mãos de alguém que veio de lá, sabe do que estou falando.

segunda-feira, fevereiro 12, 2007

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Pessoas que não conseguem ficar sozinhas são pessoas que têm medo de si mesmas, que não querem se encarar. Imagino que temem descobrir que não se gostam. Quem se encara e gosta não teme a solidão. Ao contrário, procura por ela. Para falar a verdade, eu morro de medo de pessoas que não conseguem ficar sozinhas. Elas te sugam demais. E são traiçoeiras também. Eu me sinto mais em paz só do que na companhia dos outros. Há exceções a isso que eu disse, obviamente. Mas é raro, pois depende de um outro que é raro.

sexta-feira, fevereiro 09, 2007

Sentir

Quando a porta se fechou, teve medo. Não do escuro absoluto que incidiu sobre o quarto. Medo sim de se ver forçado cada vez mais a estar apenas consigo mesmo. Sem nada para ver, acabaria se voltando para a visão interna. Tremeu ao pensar em se ver assim tão intuitivamente. No primeiro dia, rastejou pelo chão, lambendo cada centímetro do seu piso. Mergulhou em seu sabor. Por excesso, perdeu o paladar. No segundo dia, bateu palmas, cantou e gritou. Se alguma luz pudesse entrar ali, perceberia as veias saltitando em seu pescoço. Exagerou no agudo e os seus tímpanos sangraram, perdeu a audição. No terceiro dia, rolava pelo chão, esfregava-se com força nas paredes, um tato voraz que parecia querer soldá-lo no concreto. Esmagou nervos, perdeu o tato. No quarto dia, inspirava com toda a força que podia, abrindo as narinas, para captar o cheiro do chão e das paredes. Não suportou a poeira, perdeu o olfato. No quinto dia, já desesperado, forçou bem os olhos. Mas a visão sozinha é impotente sem a luz. Não teve mais como fugir. Olhou-se, enfim, com a sua intuição. Neste instante, uma lágrima cresceu no seu olho esquerdo e desceu pela face, atingindo seus lábios semi-abertos. Mas ele não pôde vê-la, nem senti-la se deslizando sobre a pele. Em sua língua, a lágrima se misturou com a sua saliva sem que ele pudesse notar qualquer diferença, nenhum sabor. Enquanto se olhava, uma vontade crescia em seu peito. Quis se tocar, cheirar seus braços, degustar a pele, ouvir o timbre da sua voz e ver as silhuetas do seu corpo. Mas nada disso era possível agora. Tentou sem resultados. Teve, então, um medo ainda mais paralisante: o de não mais poder se sentir. Compreendeu que não lhe restava mais nada a não ser essa contemplação estática e vazia de si.