quarta-feira, dezembro 26, 2007
Vergonha!
Vergonha, vergonha! Sim, é uma verdadeira baixeza lançar mão da compaixão para sensibilizar o outro quando o seu poder de sedução é nulo. E por toda a parte vemos essa vilania. Quando o seu brilho natural não apetece aos olhos do almejado, quando, ao contrário, ele lhe vê fosco, você começa então a pintar e desenhar o seu sofrimento, a sua dor. Que vulgar! Você pensa, se não sou admirado, que ao menos me distancie da indiferença pela compaixão. E assim começa a se dedicar à pintura dos sentimentos, aperfeiçoando-se no uso dos tons de cinza e do negro na arte do auto-retrato, tornando-se mestre na retórica do sofrimento, amplificando, exagerando e inventando detalhes inauditos da sua dor. Quer assim ver o outro chorando por ti, dispondo-se a seu favor, com ar protetor e consolador diante da sua fraqueza vilmente manifesta. Não, nem sempre isso é consciente, mas pouco importa, é baixo. E talvez pior ainda do que este, e repare que falo aqui de um tipo ao qual, em um momento ou outro, todos nós nos aproximamos, sim, eu também confesso a minha vilania, pior ainda é aquele que se deixa seduzir pela compaixão, oh, e também aqui sou um pecador, talvez até mais aqui. Fracos, são todos fracos, somos todos fracos. Lembremos, por exemplo, do Princípie, personagem principal de O Idiota; quando mais a sua firmeza foi necessária e demandada, quando não só o seu futuro próximo e longíngüo estavam em jogo, mas também o da sua amada Aglaia, ele fraqueja e sucumbe por completo diante da compaixão, diante da pintura mais sombria e lúgubre que Nastassia já havia feito de si mesma. Naquele segundo abissal, colossal, de um peso incomensurável, ele se atordoa, se indigna até mortalmente com Aglaia, pois sim, naquele seu instante de completa indecisão ele fere irreparavelmente o amor que ela lhe tinha, seu poder, enfim, é mais fraco que o da Nastassia, e ele se curva diante dela, a compaixão sai vitoriosa, vence até o seu amor. Aonde chegamos, meus amigos, o amor sendo vencido pela compaixão! Lutemos, lutemos contra essa vilania, essa fraqueza dupla que tenta a todo instante nos infectar e corroer.
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3 comentários:
Nossa!, parece o estilo dos filósofos "malditos", bastante forte o post. Ando lendo Maiakovski, tem um poema que é "algo", título: Dedução.
Aí pensei no que escreveste aqui, Awks, e... linkei com Nietzsche & Maiakovski (desculpe-me, adoro linkar/associar, acho que já te disse isso em algum comentário mais antigo) e... não encontro as palavras... aquela passagem em que Nietzsche diz para sermos fiéis ao que desejamos e coloca uma não-virtude como exemplo lembra, inversamente, "Dedução" de MaiaKovski. Cada um a seu modo toca na força que cada um de nós coloca/escolhe/aceita em sua Vida.
Ser seduzido pela compaixão é realmente cruel. Conseguir desvencilhar disso, falar não, é muito difícil. E pior, ficamos pensando que somos realmente importantes para aquela pessoa. Mas não, estamos sendo apenas objeto de seu orgulho. Lindo o texto, fiquei com vontade de ter escrito! hahaha beijo!
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