domingo, maio 31, 2009

Vida não-linear.

Um ano atrás eu não me imaginaria saindo de Curitiba e voltando a morar em Brasília. Um ano atrás eu recomeçava a me imaginar a trabalhar novamente com filosofia depois de ter passado alguns anos distante dela, a não ser como leitura de cabeceira. Algumas poucas decisões foram se avolumando em grandes decisões. As condições que me levaram de volta à filosofia foram parcialmente fortuitas, não estavam completamente sob o meu controle. Dependeu de um sujeito ter passado em um concurso, de uma certa bolsa ter sido, por isso, liberada e do empenho político em uma reunião departamental de um professor que eu nem conhecia, mas que tinha gostado do meu projeto de pequisa. Esse conjunto de condições favoráveis aliado as minhas saudades filosóficas e ao descontentamento com um vindouro trabalho na área de computação em uma empresa capitalista tradicional fizeram com que eu fosse novamente absorvido pela filosofia. Uma vez de volta, uma vez dando aulas e gostando da coisa, uma vez me sentindo completamente compenetrado nos textos e discussões filosóficos, não poderia me contentar com esta situação insegura de ser bolsista, ainda mais com a chuva de vagas em universidades federais por conta do REUNI e da UAB. Ainda assim, pesava nas costas a minha decisão anterior de ter escolhido vir morar em Curitiba. Poucos acreditam, mas a principal razão de ter vindo para cá foi e continua sendo o clima: é a capital mais fria do país. O prazer estético que tenho ao caminhar pela cidade também conta muito favoravelmente. Além disso, não decido mais as coisas sozinho. A pressão é forte. Anyway, apesar de todos estes fatores pró-Curitiba, vi-me coagido a ter de deixá-la provisoriamente tendo em vista a minha continuidade na filosofia. Dar aulas em instituições privadas de ensino superior, salvo algumas raras exceções, é tão ruim quanto trabalhar como programador na GVT ou na IBM. A minha entrada no departamento daqui, como efetivo, pude perceber muito bem agora, bem claramente, diga-se de passagem, não é algo que dependa apenas de mim, do meu esforço e da minha diligência. Há fatores políticos que fogem completamente do meu alcance. Não dá, assim, para contar com a sorte de bons ventos a meu favor. Então é isso, como o meu amor pela filosofia é maior que o meu amor por Curitiba e como a Marcely cedeu no seu amor por Curitiba para eu saciar o meu amor pela filosofia, decidimos arrumar as nossas malas. E, para a minha felicidade, dentre os poucos departamentos de filosofia fora daqui que me atraem, a UFSC e a UnB, um deles decidiu pela minha aprovação. Vou com algum pesar, Curitiba fica, mas também vou feliz, lá tem excelente filosofia e, pelo que me lembro, um povo muito mais simpático e interessante.

Quando olho para trás, gosto de ver que a vida não é completamente linear. Se ela te soa muito linear, então você certamente não tem tomado muitas decisões, não tem tomado em suas mãos a rédea de sua vida.

quarta-feira, maio 20, 2009

DF aí vou eu

Ao que tudo indica, talvez não tão brevemente, mas, no mais tardar, até o final do ano, parto para o Distrito Federal. UnB aí vou eu.

Livros livres


Não sei de quem foi a iniciativa, se do governo do DF, da União ou de uma ONG qualquer, mas o fato é que ela está surpreendentemente dando certo. Cada ponto de ônibus recebeu uma estante para que livros sejam ali depositados. Quem se interessar, pega o livro emprestado, lê, ali mesmo ou em casa, pouco importa, e depois devolve. Quem quiser contribuir também, escolhe um ponto e despeja as suas doações. 

A gente fica tentado a dizer que algo assim não vai dar certo, pois as pessoas roubariam os livros, não é mesmo? Pois é, mas pelos relatos brasilienses, tal não tem acontecido. Claro que algumas pessoas não devem devolver os livros que tomam emprestado. Mas deste que a percentagem dos que assim o fazem seja suficientemente pequena, ela não prejudicará o bom funcionamento da coisa. 

Fisicamente, Curitiba parece-me até mais propícia para uma iniciativa assim. Como os pontos aqui são tubos, protegendo o seu interior da chuva, a conservação dos livros estaria, em princípio, mais assegurada. Ainda assim eu acho que não daria certo, pois o curitibano médio parece ler muito pouco; infiro isso da pobreza lastimável dos sebos curitibanos. Até em Guarapari-ES encontrei um sebo de dar inveja a qualquer sebo curitibano.  Imagino as estantes nos tubos sempre vazias por falta não de doação, mas do que doar!

sexta-feira, maio 15, 2009

Euforia

Para registrar o dia e, com relativa aproximação, a hora da boa nova que me deixou eufórico. 17:00.  Dois dias de pura ansiedade finalmente resolvidos.

sábado, maio 09, 2009

Do retor

O professor retor, embora não tenha falado absolutamente nada de concreto, embora os alunos ouvintes tenham saído dali sem nenhuma informação clara, conseguiu dar a impressão de ter falado coisas muito profundas. O domínio emotivo que ele tem da linguagem é inegável, diria até que invejável, embora eu discorde dos fins para os quais ele emprega este conhecimento. Ironizar e pintar alguém de tolo é sempre um bom caminho para despertar a aceitação da platéia. Quem manipula bem esse estranho sentimento de sadismo que nos habita consegue facilmente despertar em nós a crença. Tiradas que provocam o riso também nos colocam mais dispostos ao acordo, como se déssemos o aceite em troca do prazer que nos foi dado. 

O retor, por ter o dom da palavra, tem poder, poder de causar a crença. O mais estranho, na verdade, é o que vem a seguir: no ambiente da academia, muitos percebem e captam um retor em seu uso da retórica e não só se admiram do poder do retor como o louvam e premiam, mesmo quando notam que o retor usa o seu dom para causar o assentimento gratuito, desvirtuando completamente o que pareceria, em princípio, as finalidades guias da academia: a verdade e a correção. Mas não nos esqueçamos que estes acadêmicos antes de qualquer coisa são humanos. Quando eles louvam um retor eles estão expressando o desejo de ter o poder do retor, estão cedendo à inveja despertada pela vaidade: "um dia quero ser assim também". 

A beleza da certeza

Em nome da certeza nos sentimos autorizados a fazer as maiores atrocidades. Não é de todo implausível, então, que desejemos a certeza para podermos fazer as maiores atrocidades de consciência livre. Claro que se a atrocidade se conforma com a certeza, ela não é vista como atrocidade. Seu mal só se revela quando cai a certeza, quando percebemos erro e a incerteza da certeza. De qualquer forma, queremos agir sem reprimendas, sem porém. E, por isso, a certeza nos aparece como um bem tão belo. Lá no fundo, pulsa e comanda a vontade de poder.